Uma aventura no coração do Brasil
Cartaz promocional do Filme KuarupO romance centrado no herói, como atualização da epopéia clássica; Quarup uma viagem do herói; passando por um discurso de valorização do corpo, pela inversão das relações índio e não índio, ao encontro da harmonia homem-homem e homem-terra. Padre Nando está em crise porque não consegue conter seus instintos sexuais. Seu conflito fica ainda maior quando Don Anselmo (Dionísio Azevedo) o designa a participar das missões do Xingu, pois Nando (Taumaturgo Ferreira) teme que as índias nuas o levem à tentação. Porém ele é reconfortado por uma repórter inglesa (Maitê Proença) com quem acaba tendo uma relação sexual. Dias depois, Nando vai ao Rio de Janeiro e reúne-se com as autoridades que estão criando o Parque Nacional do Xingu. Lá ele descobre que a verdadeira intenção é garantir o controle político da região. Assim, Nando viaja ao Xingu, chegando a tempo de participar do Kuarup, a cerimônia indígena que retrata a criação dos Homens. Durante a celebração, ocorre o suicídio de Getúlio Vargas, piorando ainda mais a situação política. De volta a Recife, Nando descobre que Don Anselmo foi assassinado por um amigo seu. Sentindo-se culpado, ele abandona o sacerdócio e retorna ao Xingu onde abraça de vez a causa indígena. Tempos depois, em Recife, Nando se une aos camponeses contra o regime miliar e acaba sendo preso e torturado. Mas isto só aumenta sua vontade de lutar pela liberdade. Num dos filmes brasileiros de maior repercussão internacional, o diretor Ruy Guerra faz uma análise da História do Brasil no período de 1930 ao golpe militar de 64.
Cenas do Kuarup no Parque Nacional do Xingu.
Baseado no romance Quarup, de Antônio Callado, uma das obras mais importantes da literatura brasileira comtemporânea.
Cláudia Raia em cena do filme Kuarup.
Representante oficial do Brasil no Festival de Cannes em 1989.
Outra cena do filme.
Quarup tem esse caráter de inventário, de imenso mural que abrange de Recife ao Rio, do Rio Xingu, de padres e burocratas, a índios, prostitutas, camponeses, guerrilheiros. Há uma colagem de vários instantâneos da vida nacional:
- a religiosidade - presente todo o tempo, cristã ou indígena.
- o empreguismo, as mordomias, o nepotismo.
- a situação do índio, tratada de forma diversa do que sempre se faz na Literatura brasileira, com denúncia de catequese.
- o nordeste das propriedades rurais, seus preconceitos, seu machismo, as milícias particulares, embora não se possa chamá-la romance regionalista.
- os acontecimentos políticos de 1954 e 1964.
Para compor esse painel a obra só poderia ser vasta, fiel a sua linhagem épica. O número de personagens nomeadas excede a cinqüenta. Não falta mesmo uma homenagem ao Parnasianismo: “raiava sangüínea e fresca a madrugada”. Há, ainda, objetos que marcam presença por toda a obra: pilares (pilares para o Quarup, pilar no centro geográfico, estandarte em homenagem a Levindo); azulejos (Francisca copia azulejos no mosteiro; fabricam-se azulejos com o nome de Levindo, guardando a terra do centro geográfico, destruídos e substituídos pelo golpe de 1964, enquanto padre Hosana termina seus dias cultivando verduras, ao redor da entrada do túnel de azulejos tidos como sacrílegos).O discurso é realista, fiel às personagens. No início da narrativa, 1954, aparecem, gírias de época: lesco-lesco, calma no Brasil, será o Benedito, etc.O épico Quarup trata de odisséia de Nando-Levindo, sua viagem pela região, pelo país, pelo amor, pela causa dos índios, pela política, enfim buscando integração, o engajamento total, a paz através da guerra. Em Quarup temos presente todo o tempo a tensão entre as aspirações individuais e a realidade externa, o meio circundante que, por vezes ajuda, por vezes impede e acaba por transformar as ditas aspirações individuais. É uma obra com traços romanescos, traços de irônico, até amargo, realismo. No decorrer da obra entrechocam-se vários discursos. Desse entrechoque resulta que os discursos se complementam, por vezes se superpõem, no seu papel de traçar os limites e dar as indicações para Nando e sua trajetória.É uma obra alegórica, mas a alegoria tem uma finalidade não de mascarar, mas de realçar o imanente, o histórico
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