quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Vendo o monstro se criar
Por: José Valmir Dantas de Andrade
Os episódios de corrupção envolvendo somente as mansões dos homens públicos não focam uma série de outras ações corruptas; a imprensa foca tão somente o fato individual. O que seria viável era fazer uma discussão mais profícua sobre causas. A filosofia tem um princípio básico segundo o qual nada surge e/ou emerge do nada, do acaso. Nada é causa de si mesmo. Há sempre uma gênese, uma origem das coisas; uma causa que causa os fenômenos. No caso particular da corrupção no Brasil, não é algo natural, sempre houve uma estrutura jurídico-política que, reforçada pelo modo de produção capitalista, a forjou e sustentou. E, diga-se de passagem, o modo de produção capitalista encontrou no Brasil, um solo fértil para produzir e reproduzir corrupção e desigualdade social.
A nossa elite, por sua vez, sempre nadou de braçadas, certos da impunidade, certos de que as leis no nosso país, até hoje, só têm servido para punir pobres e minorias excluídas. O músico Herbert Viana ilustrou de uma forma eloqüente a nossa realidade, na música Selvagem, quando canta:
"A polícia apresenta suas armas
Escudos transparentes, cassetetes
Capacetes reluzentes
E a determinação de manter tudo
Em seu lugar
O governo apresenta suas armas
Discurso reticente, novidade inconsistente
E a liberdade cai por terraAos pés de um filme de Godard
A cidade apresenta suas armas
Meninos nos sinais, mendigos pelos cantos
E o espanto está nos olhos de quem vê
O grande monstro a se criar
Os negros apresentam suas armas
As costas marcadas, as mãos calejadas
E a esperteza que só tem quem tá
Cansado de apanhar".
As nossas cidades foram formadas e, ainda estão se formando a partir destes arquétipos; são mansões da elite governante, os mendigos pelas ruas, meninos nos sinais e o espanto em nossos olhos vendo, impotentes, o grande monstro a se criar. Essa situação em si já é amoral e, mais amoral ainda, é saber que a desigualdade, além de tudo, de toda a sua gravidade, aqui é fruto de corrupção. Para ser mais claro, é fruto de roubo da coisa pública.

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