Revolução Árabe
Pio Penna Filho
Um mar de incertezas paira sobre o mundo árabe. A escalada de protestos contra os governos instalados na maior parte dos países árabes não cessa e a apreensão assumiu um novo patamar com a brutal repressão desencadeada pelo regime líbio contra os manifestantes.
Aspecto marcante no que está acontecendo em vários países árabes é o elevado grau de incerteza com relação ao futuro imediato. O que temos é o fato de que a insatisfação com os governos chegou ao ponto da derrama, ou seja, ganhou as ruas com uma intensidade impensável apenas alguns meses atrás.
Os exemplos da Tunísia e do Egito inflamaram parte das sociedades árabes em diferentes países, principalmente porque nesses dois casos os regimes caíram. Enquanto alguns governos vem sinalizando com a possibilidade de algumas reformas, muitas das quais bastante superficiais, a resposta do regime de MuammarGaddafi foi intensificar a repressão de forma a enquadrar os manifestantes, independente do custo humano.
É difícil prever os resultados práticos, em termos políticos, dessa resposta extremamente violenta. Alguns possíveis cenários: a) pode conter o ímpeto dos manifestantes e reafirmar a autoridade governamental; b) pode radicalizar o processo e levar o país a uma verdadeira guerra civil, sobretudo se parte das forças armadas subitamente mudar de lado; c) pode aumentar a pressão internacional sobre o governo líbio e, ao mesmo tempo, ser insuficiente para conter as manifestações populares. Nesse último caso, um longo desgaste e o prolongamento dos conflitos pode levar à queda do regime, mas não sem antes deixar um quadro terrível de morte e destruição.
De toda forma é preciso tratar cada caso considerando suas especificidades. A Tunísia não é o Egito assim como o Egito não é a Líbia. Embora a insatisfação e o desejo de mudança seja um sentimento comum no atual quadro político dos estados árabes, as peculiaridades precisam ser respeitadas.
No Egito, por exemplo, o peso das forças armadas foi determinante para a queda do regime de Mubarak. Sem o apoio das forças armadas restaram poucas alternativas para o governo. Na Líbia, qualquer análise precisa levar em consideração a forma como Gaddafi construiu o seu regime, considerando lealdades tribais, carisma, aparelho repressivo e desafio ao mundo ocidental, que são algumas de suas marcas registradas.
Mas independente de ser a Líbia, o Egito ou a Tunísia, ou ainda qualquer outro estado da região, o que deixa o analista atônito é a incerteza com relação ao que virá. Para começar, existem muitas dúvidas sobre as chances reais de implementação de regimes verdadeiramente democráticos na região.
Enfim, tudo pode acontecer. É possível a islamização ainda maior da política, assim como é possível também um processo de relativa laicização dos estados árabes. As variáveis são muitas. Por um lado, o que parece mais próximo de acontecer é uma redefinição das relações que envolvem os estados árabes e os Estados Unidos e, por outro, mudanças substanciais na relação entre os estados e suas sociedades, o que por si só já significa uma grande revolução.
*Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com
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