terça-feira, 28 de dezembro de 2010



A política externa da era Lula

Pio Penna Filho


Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com

O presidente Lula está se despedindo de oito anos de governo com uma popularidade impressionante, tendo superado todas as pesquisas que analisam a imagem popular de um presidente da república feitas até o momento no Brasil. Creio ser oportuno, no ocaso do seu governo, um balanço dos oito anos de sua política externa.
A projeção internacional do Brasil aumentou após os dois governos de Lula. Nunca tivemos uma visibilidade internacional como temos agora. Isso começou com a própria eleição do Lula, uma vez que o fato de um ex-metalúrgico ter chegado ao poder num país das dimensões do Brasil logo chamou a atenção do mundo. Na sequencia, o carisma do presidente completou e ampliou a imagem inicial favorável.
No contexto regional, apontado como prioritário pela politica externa, muitos foram os desafios encontrados. O Brasil teve que lidar com governos que apresentaram reivindicações sensíveis ao país, como foram os casos do Paraguai (revisão do Tratado de Itaipu) e Bolívia (revisão dos contratos de compra de gás), com a postura dura do governo equatoriano (no caso de investimentos brasileiros no país), se equilibrar politicamente frente às iniciativas bolivarianas da Venezuela chavista, inclusive de sua entrada no Mercosul, e das idas e vindas da Argentina, principalmente no âmbito do Mercosul.
Apontada pelos críticos como uma espécie de “diplomacia da generosidade” (por quase sempre ceder às exigências econômicas e comerciais dos vizinhos), a atitude brasileira na América do Sul tentou contemporizar uma postura de esquerda com pragmatismo político, nem sempre sendo bem sucedida, sobretudo por sua ambiguidade. Evitou assumir responsabilidades maiores, como no caso da crise envolvendo o governo Uribe (na Colômbia), as Farcs, a Venezuela, o Equador e a presença militar norte-americana na região.
No plano mundial, talvez o fato mais marcante tenha sido o reposicionamento do Brasil no sistema financeiro internacional e sua capacidade para enfrentar a pior crise econômica desde o crash da bolsa de Nova Iorque, em 1929. O presidente Lula não se conteve quando anunciou, por exemplo, que passamos a credores do FMI e chegou a criticar, duramente, a irresponsabilidade especulativa dos ricos que, afinal, foram os grandes responsáveis pela crise.
Uma novidade foi a retomada das chamadas relações Sul-Sul. Iniciativas como a IBAS (fórum de diálogo envolvendo Índia, Brasil e África do Sul) e reforço nos programas de cooperação com países menos desenvolvidos, principalmente no continente africano, marcaram de forma contundente a política externa nos últimos oito anos.
Mas a nossa diplomaciateve também os seus pontos fracos. Nos envolvemos no imbróglio hondurenho e continuamos, literalmente, a secar gelo no Haiti. A diplomacia fraquejou também frente à questão dos direitos humanos. Na África, Lula visitou países governados por ditaduras e fez feio ao lado de contumazes desrespeitadores dos mais elementares direitos. Tentou justificar o injustificável quando associou os presos políticos cubanos a bandidos comuns. Iniciou uma aproximação duvidosa com o Irã, um Estado quase pária no sistema internacional.


Em suma, a política externa da era Lula teve aspectos positivos e negativos, aliás como qualquer política externa. O diferencial é que pelo menos saímos um pouco do tradicional, arriscando e ensaiando o exercício de um papel que certamente não poderemos nos furtar num futuro não muito distante.

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